segunda-feira, 20 de junho de 2011

A tragédia não é falhar os nossos objectivos mas sim não ter objectivos

Natalie du Toit: "A tragédia não é falhar os nossos objectivos mas sim não ter objectivos"

18.06.2011 Hugo Daniel Sousa in Publico.pt

AFP
Natalie du Toit nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008
 
Natalie du Toit, de 27 anos, é uma das nadadoras mais conhecidas do mundo, porque se transformou num dos exemplos mais inspiradores da história do desporto. Apesar de ter ficado sem a perna esquerda abaixo do joelho, após um acidente de viação em 2001, continuou a perseguir o sonho de participar nos Jogos Olímpicos e conseguiu qualificar-se para Pequim 2008.
Agora tenta novo apuramento, desta vez para os Jogos Olímpicos de Londres, após os quais dará por terminada a sua carreira. A sul-africana está em Setúbal, para participar na terceira etapa da Taça do Mundo de natação em águas livres, e falou ao PÚBLICO sobre a experiência de competir com os melhores do mundo sem ter as mesmas "armas" que os adversários. Du Toit quer ser lembrada como "alguém trabalhador e perseverante" e diz que o seu caso mostra que as pessoas podem atingir os objectivos se lutarem muito por eles. E tem como mote nas suas palestras a ideia de que a grande tragédia não é falhar os objectivos, mas sim não ter objectivos a atingir.

O mote do seu site oficial é "Sê tudo o que queres ser". A minha pergunta é: o que é a Natalie du Toit deseja ser?
(risos) Esse mote quer dizer que as pessoas podem alcançar os seus objectivos. Estar nos Jogos Olímpicos era o meu maior sonho e já o consegui. E se eu consegui, as outras pessoas também o podem fazer.

Disse há três anos que qualificar-se para os Jogos Olímpicos de Pequim foi como escalar o Evereste. É possível repetir essa façanha em Londres 2012?
A minha federação ainda não escolheu a equipa que vai estar nos Mundiais deste ano [em que se jogam as primeiras vagas para os Jogos de Londres], mas obviamente que é algo que gostava de atingir. Já estou qualificada para os Paralímpicos e vou estar em Londres, mas claro que também quero estar nos Olímpicos.

Em relação há quatro anos, sente-se em melhor ou pior forma?
Tem sido um percurso difícil. Tenho treinado muito nos últimos meses e espero competir a um bom nível.

Pensa vir no próximo ano a Setúbal, onde são atribuídas as últimas vagas para os Jogos Olímpicos?
Ainda não conheço o local de competição, mas a hospitalidade nestes dias tem sido óptima. É bom estar aqui com um ano de antecedência, porque dá para conhecer o local de competição.

A sua ideia é tentar qualificar-se apenas nas águas abertas ou também em provas na piscina?
Só nos Paralímpicos é que vou estar nas provas na piscina.

Já anunciou que vai terminar a carreira após Londres 2012. Porquê?
É altura de parar, de deixar de lutar e de seguir com a minha vida.

Já é conhecida no mundo inteiro. Sente-se como um exemplo para os outros?
Sou um dos casos que mostram às pessoas que podem cumprir os seus desejos, se quiserem muito. Demorei 18 anos a atingir o sonho de estar nos Jogos Olímpicos e para muitas pessoas isso não acontece. Mas é preciso trabalhar muito e ter uma equipa à volta. Tenho um grupo de pessoas que trabalham comigo, que sempre acreditaram e que me ajudaram muito.

Quando não está a treinar ou a competir, o que faz?
Não me resta muito tempo, porque treino seis a sete horas por dia. Às vezes, vejo um pouco de televisão, leio, mas não tenho muito tempo para sair e ir a festas.

Mas sei que às vezes dá palestras a estudantes. Qual é a mensagem que lhes passa?
A mensagem é que a tragédia na vida não é falhar os nossos objectivos, mas sim não ter objectivos para atingir. Passo a ideia de que tudo é possível se acreditarmos. Nunca saberei como teria sido a minha vida se não tivesse tido o acidente, mas segui em frente.

Mas já não vê esse acidente como uma tragédia?
Bem, é verdade que aconteceram coisas boas depois disso, mas claro que sinto a falta da perna. Foi perder uma parte de mim, mas tenho de seguir em frente.

Ainda pensa muito em como teria sido a sua carreira se aquele acidente não tivesse acontecido?
É impossível esquecer completamente, porque todos os dias sou lembrada disso, porque tenho uma prótese [que tira para nadar]. Mas claro que penso que tenho de ultrapassar isto. Nem sempre é fácil, mas há muita gente que acredita em mim.

Hoje compete com os melhores nadadores do mundo. Isso obriga-a a treinar muito mais do que os outros?
Sim, claro. Tenho de treinar mais do que os outros, porque o meu corpo não é igual. Tenho de treinar aspectos que os outros não precisam.

Já lhe fizeram centenas de perguntas sobre a sua vida e a sua carreira. Há alguma pergunta que nunca lhe fizeram e a que gostasse de responder?
(risos) Bem, há muita gente que pensa que eu sou a pessoa mais optimista do mundo, mas na verdade devo ser das mais pessimistas. As pessoas à minha volta é que são muito optimistas e isso fez uma grande diferença. Outras pessoas pensam que foi fácil, mas foi muito difícil para mim e para as pessoas que me rodeiam.

Como gostaria de ser recordada no mundo do desporto?
Como alguém trabalhador e perseverante.

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